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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Aprender a ser...

No inventário cultural brasileiro, entre as várias canções que dialogam entre si, gostaria de chamar a atenção de duas: "Aprendi a Ser Só" e "Aprendi a Só Ser".
A primeira, composição de Tom Jobim, versa sobre a necessidade de se aprender a ser solitário. Tal opção seria motivada por constantes deslizes amorosos que indicam que é melhor viver sozinho para não sofrer.
A segunda canção, obra de Gil, prega a adoção de uma postura na qual devemos nos aceitar como somos e simplesmente vivermos. Sejamos  lindos, feios, solitários ou multidão. Apenas devemos viver, sem nenhuma aspiração além dessa.
Ambas apontam para opções de vida: a primeira para uma vida solitária, a segunda para o simples viver.
Entretanto, se o Edward "Mãos de Tesoura' ouvisse as duas canções possivelmente estabeleceria as seguintes reflexões sobre elas:
_ Ser solitário não é uma opção. Talvez seja nas obras de ficção ou nas notas de uma canção, mas na vida real a maioria das pessoas solitárias não são assim porque o desejam;
_ Ninguém existe por existir, ninguém aprende a só ser. sempre aprendemos a ser algo, seja algo pelo qual lutamos ou algo que outros tentam nos incutir.
_ O mundo não aceita os que só querem ser, mesmo que eles queira ser só eles mesmos.
Esses que querem ser eles mesmos, embora adotem a postura mais comum entre os humanos, que é a de só ser, são caracterizados como sendo diferentes.
Simplesmente ser o que você é lhe torna diferente dos demais.
Dessa forma, Edward "Mãos de Tesoura", um ser diferente por ser o que é, embora produza um fascínio inicial, nunca será aceito. ele pode fazer coisas bonitas e ser sublime, porém sempre será menos aceito do que alguém tido como normal, mesmo que tal indivíduo tenha um caráter duvidoso.
Sempre irá pairar uma sombra de dúvida e de descrença sobre o diferente, faça o que ele faça.
O destino final de Edward nos mostra isso. A convivência com alguém que o amava lhe mostrou isso.
Caso ele ouvisse essas duas músicas brasileiras ele prontamente concordaria que "Aprender a Só Ser" traz como consequência a necessidade de "Aprender a Ser Só".

sombra de caco

Ouvir as falas sinceras, não poder falar o que pensa. Receio de agredir o outro que já se sente agredido. Defender-se do que não deveria ser defendido, pois não foi feito o que é tido por feito.  Cerrar a boca, restringir os olhos, computar mais um número em uma discussão perdida. 
No fim parece que ninguém ganhou. 
Ou não se sabe se era pra alguém ganhar.
O sabor que permanece na boca não é doce. Talvez resultado do ato podre de ter machado o dia.
Lidar com o coração na mão e ser forte. Mas ser forte não significa ser de plástico.
Então ondas de emoção soltam os nós de palavras que estavam reservadas pra outros momentos.
E essas mesmas ondas de emoção trazem palavras na direção contrária, que podem ferir, já que o peito, embora forte, seja feito de carne, e não de plástico.
Depois disso o sorriso murcha no rosto, o caminhar torna-se trôpego...
E o espelho reflete a sombra de um caco...

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Em busca de luz e paz

Vagava trôpego em um chão de lodo.
Os pés afundavam, mas com esforço continuava a avançar.
Caminhava entre trevas em busca de algo além delas. Na verdade prosseguia em busca de algo além dele.
Transpirava forte, respirava fundo, desbravava seu mundo. Em seu caminhar, devido a penumbra, não distinguia os homens de suas sombras. Por vezes duvidava se ele mesmo não era uma sombra. Porém prosseguiam pois talvez tudo ganhasse sentido junto à luz, ao clarear.
Acompanhando pingos, lampejos e cacos de luz chegou até uma região alta e clara.
Olhou ao seu redor e viu o mundo despido de treva.
Vislumbrou o motor das relações humanas, as verdades por trás da verdade e os sentidos construídos do sangue apodrecido no chão.
Ele finalmente entendeu porque a luz se escondia na treva...

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O Monstro

Ele era um homem violento.
Era o que lhe diziam.
Por isso se amordaçava, prendia a violência que tinha.
Mas ela escapava, deslizava pelos poros.
O fluido intenso tocava o ar e se inflamava.
Queimava o corpo, desatava as amarras: eis o monstro à solta.
Imenso, quente, poderoso... e ridículo como todos os homens.
O monstro não destruía casas, não arremessava montanhas, apenas existia.
Na verdade luzia, brilhava no fundo daquela alma. E mostrava ao homem o que ele não queria.
Por isso ele o escondia, o amordaçava, o prendia.
Era um homem violento, violentava o próprio monstro que o consumia...

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A indiferença se manifesta
não quando uma presença não é querida,
mas sim quando uma ausência já não é sentida.
Quando perdemos o encanto diante dos olhos de alguém
somos criticados pelo que somos, pelo que não somos,
por não correspondermos aos sonhos...

domingo, 30 de janeiro de 2011

O Corpo

O corpo já está um pouco apodrecido. Também já fazem dois dias.
Poderia dizer que foi sem intenção? Sem desejo de matar?
Não tenho certeza disso.
Bati com força. Sem dó. Sem ódio. Só bati.
Não sei se era preciso tanto, mas ele estava me incomodando.
Eu só queria ler um livro. Apenas ler, respirar, sorver o conhecimento daqueles livros.
Mas ele não permitia isso. Fazia barulho, incomodava.
Pela sua aparência percebi que seria impossível nos entendermos com palavras,  por isso tentei afugentá-lo com gestos.
Mas não adiantou, pois ele não se intimidou.
Perdi a paciência e bati com um volume encadernado em sua cabeça.
Ele parece não ter sentido nada. Nem a pancada e muito menos a imponência de um volume encadernado.
Realmente era uma criatura insensível.
Por isso bati de novo. Um golpe forte. Certeiro. Acertei em cheio.
Uma parte da cabeça foi esmagada. A criatura negra e robusta ficou imóvel, silenciosa.
Em meio a tanto silêncio escondi o corpo junto ao lixo.
Limpei o livro. Lavei as mãos.
De mãos limpas retornei às minhas leituras.

No dia seguinte notei que o corpo continuava no mesmo lugar.
Será que ninguém o viu? Ou se viu fingiu que não viu?
Bem, como ele estava imóvel, silencioso e não atrapalhava minha leitura, não me importei.

Hoje, após dois dias, o corpo continua ali.
Podre já incomoda. A podridão sempre incomoda, por isso a escondemos.
Quanto tempo mais este corpo ficará ali?
De quanto em quanto tempo recolhem o lixo deste lugar?
Vou reclamar do esquema de limpeza daqui.
Espero que o pessoal da faxina não fique bravo por ter de recolher o corpo.
Não o coloquei dentro dos sacos porque tive nojo.
Não gosto de pegar em insetos.